quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Mia Couto em Ribeirão


É isso aí, o escritor moçambicano Mia Couto estará na Biblioteca Padre Euclides, amanhã, dia 26 de agosto de 2010, às 19 horas, para um encontro com o público.
O evento é uma realização da Oficina Cultural Candido Portinari, sob a batuta da nossa amiga Fatu.
Mia é contista, romancista e poeta, e tem estado por aqui, na bienal e em debates por São Paulo.
Deixo aqui um poema dele para fazer-lhes vontades.
Apareçam



Horário do Fim

morre-se nada
quando chega a vez

é só um solavanco
na estrada por onde já não vamos

morre-se tudo
quando não é o justo momento

e não é nunca
esse momento

terça-feira, 24 de agosto de 2010

A virulência do mau humor


Ok, eu sei que ficar em fila é chato, mas há alguns lugares, em certas ocasiões, mesmo que ocasionalmente,em que isso acontece.
Frequento o correio aqui perto de casa.
É coisa minha, arcaica, escrevo cartas à mão e as mando pelo correio, por isso sei horários de postagem, tempo de entrega e hora que o carteiro passa em minha casa e na casa dos correspondentes.
Digo que, depois da terceirização, nem sei se é esse o termo, que agora sofre alguma polêmica, por conta de alguma nova regra, etc.., os correios se tornaram confiáveis e ágeis, portanto defendo este formato, pois me utilizo do serviço.
O correio daqui de perto, costuma ter fila , alguns dias, mas não há falta de funcionários, e possui um ar condicionado redentor que transforma a espera num aprazível descanso.
Hoje havia fila, nada extraordinária, e eis que a pessoa que estava atrás de mim, logo ao estancar seus passos, se pôs à reclamar da demora, do desrespeito e da ausência de gerente à tomar as providências cabíveis.
Disposta á não estragar o meu dia com neuras alheias, fingi uma surdez plena, o que não foi suficiente para estancar o gralhar mal humorado do ser ao meu lado.
Julguei que, se não tivesse ouvintes, pararia de falar, se não houvesse platéia, não haveria espetáculo.
Julguei mal, pois não satisfeita em vociferar asneiras pediu-me que lhe guardasse o lugar pois iria procurar,alguém de poder, para garantir seu "direito".
Virei-lhe acintosamente as costas e voltei meu pensar às pequenas maravilhas que se percebe numa fila.
Uma criança de colo que sorri, uma senhora em traje alegre e elegante, uma moça de vestido, office boys com fones de ouvido e pilhas de pacotes, as funcionárias atentas à fila, ao trabalho, à demora e à desagradável reclamante.
Pouco foi o tempo de diversão, menos de 10 minutos, e logo fui chamada, junto com a digníssima e mal humorada senhora, que insatisfeita por não achar adeptos á sua demanda, continuou a ladainha no ouvido da paciente atendente.
Cuidado, caros amigos, para naõ cair em armadilhas.
Mal humor é contagioso.
Sorte que ali todos estavam muito bem informados, e por isso vacinados, e assim que a doente deixou o recinto todos sorriram aliviados.

domingo, 22 de agosto de 2010

Poema para Berenice


Quando vi no jornal sobre o novo livro de Adélia Prado," A Duração do Dia", fui tomada do desejo de sua voz e na primeira oportunidade busquei por ela.
Não há novidades, Adélia está lá plena e ela, muito mais do mesmo, sempre amado e apreciado.É como lambuzar-se com seu doce predileto. Um nunca enjoar-se.
Li-o, olhos bem abertos para não perder detalhes. Na memória a face amiga, a voz doce e firme de Adélia, dona das letras feitas fonemas em meus ouvidos, o cheiro acolhedor do café, sua mineirice que brota incontida.
Por sua religiosidade, seu louvor e fervor pensei que um poema de Adélia fosse bom presente para Berenice, que gostava destes arroubos, destes encontros íntimos com Deus.
Nunca saberei, mas a ela o ofereço, e também à Cândida,que faz anos por estes dias e à quem ainda posso perguntar se gosta de Adélia, se a aprecia, e a aceita como presente,uma lembrança amorosa de quem a admira.

TÃO BOM AQUI- Adélia Prado

Me escondo no porão
para melhor aproveitar o dia
e seu plantel de cigarras.
Entrei aqui pra rezar,
agradecer a Deus este conforto gigante.
Meu corpo velho descansa regalado,
tenho sono e posso dormir,
tendo comido e bebido sem pagar.
O dia lá fora é quente,
a água na bilha é fresca,
acredito que sugestiono elétrons.
Eu só quero saber do microcosmo,
o de tanta realidade que nem há.
Na partícula visível de poeira
em onda invisível dança a luz.
Ao cheiro de café minhas narinas vibram,
alguém vai me chamar.
Responderei amorosa,
refeita de sono bom.
Fora que alguém me ama,
eu nada sei de mim.

ps: os personagens desta estória
Berenice- minha sogra, que faleceu há alguns anos
Cândida- uma pessoa querida, com quem pouco estou
Adélia Prado- escritora, ser abençoado que nos abençoa com seu ser

terça-feira, 17 de agosto de 2010

clube de leitura Fernando Pessoa


Amigos, o clube de leitura da Palavra Mágica se reúne às terceiras terças feiras de cada mes.
Estamos com a tarefa hercúlea de ler os heterônimos de Fernando Pessoa.
O da vez é Álvaro de Campos.
Li-o presa de agitação interior, certa ira, e alguma indignação.
Encontrei ali o espelho e a certificação de que não fui a primeira nem serei a última á sentir-me assim.
Agruras de quem se dispõe á viver.


LISBON REVISITED (1923)

Não: não quero nada.
Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafisica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!)
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja de companhia!

Ó céu azul o mesmo da minha infância ,
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflecte!

Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.
Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

notícias poéticas- agosto de 2010

As "Notícias poéticas" estão de aniversário, 4 anos. A inspiração me veio num agosto
" Agosto é feito de poeirentos ventos...".
Elas são minha percepção pessoal do mes vindouro e mais um poema feito na hora, por isso nem sempre em forma final. Pedra bruta sem lapidação.


Notícias poéticas- agosto de 2010

Venta Agosto, um vento novo, vigoroso, neste mês condenado injustamente por uma rima fatal. “Agosto mês do desgosto”.
Dito mencionado e não aceito, elejo agosto o mês dos poderosos ventos, benfazejos, impulsionando a realização do que foi sonhado, planejado, desejado, almejado.
Certo que nada é fácil. Somos sujeitos à desgastes e arranhões. É o preço cobrado de quem se expõe à vida.
É tempo de fazer acontecer. É tempo de trabalho.
Abaixo os lamentos! Xô desânimo!
Agora é a hora. Eu vou. Vamos?
Avante e além!
Boa sorte, é o que nos desejo , é o que merecemos.
Beijos. Vos encontro ao sabor dos ventos.

Ambiguidades
Não venta
E tudo se move
Quer se queira
Ou desaprove

O desejo é largo
Torce-se
Pelo gargalo
Mui estreito do tempo

O que pinga é doce
Destilado que inebria
Sem iludir
Alegria concentrada e volátil

Todo dia há infortúnios e glórias
Equilibra-se a balança
Roubando no peso
Que pesem à favor a poesia, o prazer e a beleza

O céu é limpo
Nuvens são enfeites
Nada real, entre nós e o futuro.
(obstáculos são imaginários)

Pedras são pó
Poeira agregada
Que nubla
Mas não cega

Sabemos
Ainda assim dói,
Lutamos, tratamos de sobreviver,
E crescemos...
Eliane Ratier, agosto 2010

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Instruções para Viagem

Lá longe, saber-se há quando e como, conheci o Matheus, que trabalhava na STB, Student Travel Bureau, uma agência de intercâmbio, e que estava iniciando um projeto de divulgação da cultura brasileira para os jovens que iriam viajar, através de uma manhã cultural.
Num bom bate papo, ele me abriu as portas da casa e assim fizemos o sarau da Bossa Nova. Eu, dizendo um pouquinho da história da coisa e lendo as letras das músicas e o Dú Junqueira no violão. A delícia. Era lançada a semente dos saraus.
Na época inspirada pela situaçaõ escrevi estas "Instruções de Viagem", que estão nos "Mimos da Papel", e que agora reavivo pois vivo, em pele própria, esta estória.

Instruções de viagem

Filho, querido, amor, amigo,

Em breve partirás,
Desbravador do desconhecido.
Vá de peito aberto,
Cheio de coragem.
Pondere as escolhas.
Siga o teu destino,
Teus passos serão os mesmos,
Aqui e além,
Afinal, você é,
E continuará sendo, você,
Esta pessoa do bem.

Você não vai para Marte, ou para Vênus
Este nosso vasto mundo é pequeno.
Não estarás sozinho,
Estarei contigo
No lugar de costume:
No ventrículo direito
Do lado esquerdo do peito;
Em rápidas imagens da mente;
Na foto junto aos teus pertences.
Estarei sempre ao alcance dos dedos:
No skype, orkut, msn,
No teclado do telefone,
24 horas no celular,
Nas letras, rabiscadas rápidas,
Nos cartões postais.

Olhe a gente.
Veja as cores.
Cheire os espaços.
Ouça as cidades.
Experimente as paisagens.
Prove comidas.
Sinta o gosto de outras línguas.

Não lave os sapatos.
Trarás neles o pó de outras terras.
Não esqueça os detalhes
Para contar-me.
Não deixe que a saudade,
Esta palavra exclusiva da nossa língua,
Te impeça de partir,
Mas que ela te lembre de voltar.
Não temo despedidas,
Espero pelo prazer do reencontro.
Divirta-se.

Eliane Ratier

Vinícius de Moraes - poemas inspirados- Eliane Ratier

Histórinha-
Coordeno um dos clubes de leitura da Fundação Palavra Mágica, aqui em Ribeirão Preto.
Nosso tema é poesia e nosso primeiro poeta foi Vinícius.
Já vinha pesquisando sua vida para um outro trabalho, e o mergulho em seus escritos fez brotar de mim este poema na voz do próprio homem sedutor.

Viniciana- à moda de Vinícius de Moraes

E porque te amo
E toda minha mão desenha letra
E toda letra te chama
É que me entrego
Teu e não outro
Só o mesmo eu
Que te venera e canta
Por entre as ramas
Através dos bosques
Tua beleza e ternura
Tua presença e falta
Teu ser que pulsa
Qual estrela quasar
Ofuscando luas

E porque te quero
E todo o meu corpo grita mudo
E o silêncio é loquaz
É que te atraio
E traio teu confiar
Faço de meus braços armadilhas
Do meu riso promessas
Do meu ventre
Sexo de insaciável vício
Da minha voz
Ceceio em teus ouvidos
E te prendo minha
E te faço minha
E te faço feliz por isso.

Eliane Ratier, maio de 2010

Vinícius de Moraes - poemas inspirados- Jeferson

O Jeferson é de Ituverava e nos mandou este poema quando ficou sabendo do sarau em homenagem à Vinícius

Vinícius de Moraes


Aqui em minha terra chega ventania com poeira montada.
Chega pássaro em bando (passarada).
Chega chuva no final de Agosto.
Chega ônibus, carro, pouco avião, e trem só de carga.

Aqui em minha terra me brotou um sonho besta
Um sonho que não mata a fome,
Não paga as contas,
Nem dorme.

E chegou com mais força que tudo que chegara.
Veio da delicadeza de uma poetisa,
Arrancou-me de meu solo.

Com essas asas eu posso voar!
Até Vinícius de Moraes chama-me em minha casa
E eu venho, por que a vida é agora.


Por Jeferson Cardoso de Matos (http://jefhcardoso.blogspot.com)

Vinícius de Moraes - poemas inspirados- Vera Regina

PRESENÇA DE VINICIUS
ao poetinha

Caros amigos sou eu,
não faz tempo que parti.
A partida me doeu
a dor que sempre temi.

Amores tantos cantei
o canto do amor sem fim,
no final foi que chorei
o choro que estava em mim.

Não sabia mais rezar
as rezas que aprendi,
valeu foi saber amar
amigos que não esqueci.

Mário e Bandeira encontrei
o encontro me assustou.
Depois do susto rezei
a reza me sossegou.

Não sendo diabo nem santo,
Vinicius ainda sou.
Quando não choro canto
a saudade que ficou.

Caros amigos voltei
apenas para encontrar
amores que aqui deixei,
as saudades sufocar.

Vera Regina Marçallo Gaetani

domingo, 8 de agosto de 2010

Vinícius de Moraes- poemas inspirados- Djalma Cano

Por ocasião da morte de Vinícius, Djalma Cano escreveu esta elegia:

ELEGIA AO POETA QUE PARTE djalma cano

Nove de julho de 1980, sete horas da manhã.
Uma grande pomba branca
Leva em suas asas
O grande cantor da liberdade;
O arauto da esperança;
A esperança do amor...

Tinha que ser julho,
O mês das grandes batalhas pela liberdade.
Tinha que ser 9 (o dia em que teve povo
nas praças e nas trincheira
brigando pela Constituição).
Tinha que ser 9 de julho
O dia em que o poeta
Venceu a vida;
E nela o seu canhão
Sempre arremessou
Seus dardos a favor da liberdade;
Lançou as flores em cumplicidade
Estreita com o amor...
E nesse mês, comungando com a batalha
Do rouxinol,
Sierra Maestra deve verter lágrimas,
E a Argélia deve perfilar-se toda de branco
No abraço ao soldado da palavra...
Palavra que ficava mais fácil em sua pena
E paria-se de gozo sublime
Quando cantava as aventuras dos homens livres
E das mulheres plenas e fecundas
A rolar por alvos lençóis
Em leitos suspeitos
E sempre carregados de ternura...

Cantor da inocência (mesmo a fingida)
E da ingenuidade (quase sempre ferida)
Derramava seus versos
Tal qual notas musicais
E a melodia
Fluía do papel
Para encontrar
Nossos ouvidos

E conseguir o milagre
Da partitura sem maestro
Fazendo imitar no âmago
De nossa intimidade
O som de uma boca
Que beija, que blasfema
Que grita, que chora
Que conforta, que fere
Que sorri, que implora
Que gargalha sem ruídos
Que enternece em silêncio...
Só quem te conheceu,
Um pouco que seja
(mesmo apenas lendo teus versos)
Sabe dizer
Quanto dói pensar que deixaste
De criar para nós
Assumindo a alvura
Que se supõe estar envolta
A figura do poeta
Na nova vida que alcança...

E resta agora rever o que fizeste,
Escutar o que deixaste de imortal
E assim viverás de novo, aqui,
Neste confuso mundo que sobrou
(E no qual tu acabas de deixar
espaço amplo e profundo).
Que virá depois de ti, meu poetinha?
O gosto amargo da partida?
Aquela ausência dolorida
Que a gente curte quietinho,
Dizendo que é mentira?
Que o jornal mentiu só para esgotar a edição?
Que a TV não tinha o que fazer,
Numa hora em que o Papa
Descansou da maratona
E sapecou a tua notícia?...
Não, poeta.
Eu vi o povo se despedindo de ti,

Repetindo os teus versos
Em forma de música
Quando o chão se fechou sobre teu corpo...
Meus olhos não me mentiram.
E por dentro eu fiquei menor, encolhido.
Cuidei da vida,
Mexi na estante,
Vi teu livro,
Vi tua foto recente onde os cabelos
E a barba brancos
Faziam moldura
Para o rosto cansado (melancólico?).
Que sustentava o olhar sempre triste
A refletir a angústia dos que amam
E que fazem da liberdade
O sentido da vida...

Poeta, cheguei a ter uma pontinha
De satisfação
Ao saber que cantaste
Até às cinco horas da manhã,
E pensei: ele não perdeu nem a aurora
Do dia em que resolveu se mandar.


Eh, bravo soldado!
Escuta meu clarim
A romper o peito,
Querendo deixar bem claro
Que vou te ser fiel,
Vou te amar como sempre,
Nem que seja escrevendo para ti,
Nem que seja ouvindo-te,
Lendo teus livros...

Adeus amigo, poeta, homem livre!
Que encantes
Quem te encontrar
Neste novo caminho
(cheio de flores e mel)
Para onde te levaram!

http://fenix46.blogspot.com

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Sarau do Vinícius de Moraes


Ontem , na Paraler do Ribeirão Shopping, fizemos um sarau em homenagem à Vinícius de Moraes.

O momento foi de encantamento e paz, com Eula e Alessandro trazendo a boa música de Vinícius, os poetas lendo seus poemas homenagem , inspirados por ele, o pessoal do Clube de Leitura da Palavra Mágica, demonstrando seu interesse e envolvimento entusiasta com a literatura, a presença de novos convivas que prometem voltar, e o amigo Loureiro registrando tudo com a sua super máquina.

Ainda bem porque a minha me deixou na mão, estava sem pilhas.

Deixo aqui o texto de abertura e colocarei em breve os poemas dos escritores de casa sobre o assunto.


" e o dia amanheceu em paz"


Sarau Vinícius de Moraes- 03 de agosto de 2010 - Paraler


A benção Marylene, e povo da Paraler
Com vossa benção meu público
Com vossa benção artistas, músicos, escritores, atores, que foram por Oxalá ungidos, por Xangô tocados, mandados à servir ao mundo com a beleza de seus atos
A benção Iemanjá, rainha
A benção Iansã, madrinha
A benção poetinha

É assim , como você costumava fazer no seu tempo, que abro este singelo tributo à sua memória.

Foi num 09 de julho , há 30 anos atrás que Vinícius nos deixou.
Eram 5 da manhã, estava trabalhando nas letras da Arca de Noé, seu musical infantil, resolveu que era hora de uma pausa, escolheu um de seus gostos,( ele os tinha muitos, wisky, cigarro, mulheres, amigos) optou por um banho de banheira, e foi ali que morreu.
Acudiram-no a nona mulher, Gilda, e o parceiro da hora, Toquinho.

Foi-se a carne do poeta, compositor, dramaturgo, mas sua obra o perpetua e assim revivendo-a , celebramos seu legado , sua vida.

Vinícius é de 1913, carioca, seus pais tinham dons musicais, um pé na boemia.
O segundo de quatro irmãos, o escolhido para ter uma educação de primeira.

Formou-se advogado, tornou-se funcionário público, ganhou uma bolsa para estudar no exterior, abriu as portas do mundo, colaborou para jornais e revistas, passou no concurso do Itamaraty ,foi diplomata, já era poeta, e a música lhe era latente.

Foi pródigo em amizades, era o poeta dos amigos, dos encontros. Vivia cercado de gente, muitas vezes bem mais nova do que ele, aprendizes que bebiam na fonte de Vinícius: Nara Leão, Edu Lobo, Chico Buarque , Miúcha, os parceirinhos Tom Jobim, João Gilberto, Baden Powell , Carlos Lyra, Francis Hime, Toquinho, além dos clássicos, Pixinguinha e Ary Barroso, e mais um tantão de gente.

Tinha horror à solidão, cercava-se dos amigos até para dormir.

Era movido à paixão.

Casou-se nove vezes na esperança vã de perpetuá-la.

E é à estas nove mulheres oficiais, Tati, Regina, Lila, Maria Lúcia, Nelita,Cristina, Gesse, Marta e Gilda, e muitas outras extra oficiais, que somos gratas por fornecerem ao poetinha sua inspiração.

O caso do “poetinha”, usado pejorativamente por alguns, era na verdade a reciprocidade carinhosa com a qual Vinícius era tratado por seus pares,que recebiam dele tatibitates em diminutivo, menininho, parceirinho, beijinho, amorzinho, paizinho.

A poesia inicial de Vinícius era marcada pelo classicismo, e temas elevados.

Mesmo quando seu verso se popularizou, não abandonou a forma. Seus sonetos estão entre sua poesia mais apreciada.
Esteve entre os grandes, Carlos Drummond, Neruda, João Cabral, conviviam, se gostavam, eram “chapas”.

Como compositor, foi o precursor da Bossa Nova. Com o samba Chega de Saudade, em parceria com Tom Jobim, no violão de João Gilberto e na voz de Elizete Cardoso, lançou nova e universal moda. Inédita na forma e no conteúdo dos versos da canção, ninguém falava assim, em música, com o despojamento e naturalidade, coloquialidade e diminutivos.
Nascia aí a Bossa Nova.

Como Vinícius era diplomata, suas apresentações musicais eram algo incômodas para seus superiores. Havia então, algumas regras. Vinícius se apresentaria de terno e gravata e não poderia receber por isso.

Os afro sambas, outra invenção de Vinícius

Quando Baden lhe apresentou os cantos do Candomblé, sua paixão foi instantânea, e surgiu assim, toda um cancioneiro inspirado no Candomblé e sua mitologia. Canto de Ossanha e Berimbau, são bons exemplos.
Morou na Bahia, casou- se como uma baiana, era iniciado nos terreiros, reverenciado pelas mães de santo.
Ungido e protegido.

E tinha o teatro, com Orfeu da Conceição, Pobre Menina Rica, que eram inovadores e corajosos em sua temática e cunho social, muito em voga nos anos 60.

Vinícius é um clássico.

Um homem inquieto, que transformou sua inquietude em versos de rara beleza.

E nós, somos os privilegiados por tê-lo.

Numa entrevista, na véspera de sua morte, responde á pergunta do repórter: “ Você está com medo da morte?. Não meu filho, eu não estou com medo da morte, estou é com saudades da vida”.

Marcus Vinitius da Cruz e Mello Moraes

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