terça-feira, 29 de novembro de 2016

Um pouco de Cecília Meirelles




Novembro de Cecília

Cecília é muito mais do que o pouco que está aqui escrito.
Não percam  oportunidade de conhecê-la.

Cecília Meirelles , poeta maior da nossa língua, professora e divulgadora da cultura nacional mundo a fora.
Escritora premiadíssima!
Nasceu no dia 7 de novembro de 1901 e faleceu em 09 de novembro de 1964.
Ao conhecer sua história fiquei tão comovida e apaixonada que me senti doente, doente de Cecilia.
Cecilia, aquela que se deixa cortar a cada primavera para renascer inteira.
Cecília do autobiográfico “Olhinhos de Gato”.
Cecília dos barcos, dos luares, do mar, dos andares.
Cecília para adultos e crianças, leigos e especialistas.
Cecília para todos!
Sempre, sempre e mais Cecília!
ps: Curiosidade:  o Meirelles tem dois eles, oficialmente. Meireles, com um ele só foi adotado pela autora que  atribuiu à esta nova grafia uma melhora em sua vida.

CANÇÃO DE ALTA NOITE

Alta noite, lua quieta,
muros frios, praia rasa.

Andar, andar, que um poeta
não necessita de casa.

Acaba-se a última porta.
O resto é o chão do abandono.

Um poeta, na noite morta,
não necessita de sono.

Andar... Perder o seu passo
na noite, também perdida.

Um poeta, à mercê do espaço,
nem necessita de vida.

Andar... — enquanto consente
Deus que a noite seja andada.

Porque o poeta, indiferente,
anda por andar — somente.
Não necessita de nada.

De Vaga Música (1942)

Este poema de Cecília me trouxe bons momentos e bons amigos.
Logo que comecei meu trabalho literário houve a oportunidade de fazer leituras e oferecer poemas que ficavam dependurados num varal na PraçaXV em homenagem `a um dia comemorativo qualquer.
No varal, este poema.
No meu sentir e ser, este poema.
Por ele, Jair Yanni e Ely Vieitez Lisboa, pessoas que admirava e que conheci pessoalmente ali, lendo Cecília.
Aproveitem!!
Cecília Meireles

Gargalhada
 

Homem vulgar! Homem de coração mesquinho!
Eu te quero ensinar a arte sublime de rir.
Dobra essa orelha grosseira, e escuta
o ritmo e o som da minha gargalhada:


Ah! Ah! Ah! Ah!
Ah! Ah! Ah! Ah! 


Não vês?
É preciso jogar por escadas de mármores baixelas de ouro.
Rebentar colares, partir espelhos, quebrar cristais, 
vergar a lâmina das espadas e despedaçar estátuas, 
destruir as lâmpadas, abater cúpulas, 
e atirar para longe os pandeiros e as liras...


O riso magnífico é um trecho dessa música desvairada.


Mas é preciso ter baixelas de ouro, 
compreendes?
— e colares, e espelhos, e espadas e estátuas.
E as lâmpadas, Deus do céu!
E os pandeiros ágeis e as liras sonoras e trêmulas...


Escuta bem:


Ah! Ah! Ah! Ah!
Ah! Ah! Ah! Ah! 


Só de três lugares nasceu até hoje essa música heróica:
do céu que venta, 
do mar que dança, 
e de mim.
 


Cecília é toda linda!

LUA ADVERSA 

Tenho fases, como a lua
 
Fases de andar escondida,
 
fases de vir para a rua...
 
Perdição da minha vida!
 
Perdição da vida minha!
 
Tenho fases de ser tua,
 
tenho outras de ser sozinha.
 

Fases que vão e vêm,
 
no secreto calendário
 
que um astrólogo arbitrário
 
inventou para meu uso.
 

E roda a melancolia
 
seu interminável fuso!
 
Não me encontro com ninguém
 
(tenho fases como a lua...)
 
No dia de alguém ser meu
 
não é dia de eu ser sua...
 
E, quando chega esse dia,
 
o outro desapareceu...

Cecília das crianças.

A Língua de Nhem


Havia uma velhinha
que andava aborrecida
pois dava a sua vida
para falar com alguém.
E estava sempre em casa
a boa velhinha
resmungando sozinha:
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem...
O gato que dormia
no canto da cozinha
escutando a velhinha,
principiou também
a miar nessa língua
e se ela resmungava,
o gatinho a acompanhava:
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem...
Depois veio o cachorro
da casa da vizinha,
pato, cabra e galinha
de cá, de lá, de além,
e todos aprenderam
a falar noite e dia
naquela melodia
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem...
De modo que a velhinha
que muito padecia
por não ter companhia
nem falar com ninguém,
ficou toda contente,
pois mal a boca abria
tudo lhe respondia:
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem...
Cecília Meireles, Ou isto ou aquilo

Anexo mais este poema, por recomendação dos leitores

Epigrama Nº 8

(Cecília Meireles) 

Encostei-me a ti, sabendo bem que eras somente onda. 
Sabendo bem que eras nuvem, depus a minha vida em ti. 

Como sabia bem tudo isso, e dei-me ao teu destino frágil, 
fiquei sem poder chorar, quando caí.


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